Os computadores são bons com números e por isso estão a escrever
Há empresas a desenvolver algoritmos para escrever notícias. Mas decidiram expandir o negócio para outra áreas.
Os computadores conseguem processar
rapidamente enormes quantidades de dados. Mas têm muito mais dificuldades em
perceber e usar linguagem natural, como aquela a que os humanos recorrem
diariamente. No entanto, há empresas cujo negócio é desenvolver algoritmos
capazes de escrever texto que seja coerente e possa ser compreendido por
pessoas.
Esta tipo de tecnologia levou a que, nos anos
recentes, a pergunta se tenha repetido numa miríade de artigos de jornais,
revistas, sites e blogues: podem os computadores substituír os jornalistas?
Afinal, empresas como a Narrative
Science e a Automated
Insights, ambas dos EUA, estão há anos a desenvolver algoritmos
capazes de escrever notícias.
Tanto uma como outra começaram por pôr os
computadores a escrever notícias precisamente sobre números. Eram textos curtos
sobre resultados desportivos, normalmente de competições (amadoras ou de
jovens) a que os jornalistas não dão atenção. Com acesso a elementos como o
resultado, o nome e as acções de cada jogador, bem como as faltas e outras
ocorrências importantes (que normalmente ficam registadas numa base de dados) o
algoritmo é capaz de criar um texto coerente. Não fará comentários sobre o
entusiasmo (ou falta dele) nas bancadas, nem sobre um aparte do treinador. Mas
as notícias são capazes de oferecer um resumo decente da partida.
O historiador de tecnologia e cultura Edward
Tenner, que já escreveu ensaios sobre o assunto, argumenta que os jornalistas
não devem estar preocupados com esta tecnologia. “A não ser que haja um salto
radical no desenvolvimento de algoritmos para resolver as questões muito
difíceis da inteligência artificial, vamos continuar indefinidamente a precisar
de humanos competentes para a maior parte do trabalho mental e físico”, explica
ao PÚBLICO. “Ainda precisamos de médicos que vejam a pessoa como um todo e de
advogados psicologicamente sensíveis aos clientes e juízes, não apenas de
máquinas capazes de raciocínio legal”. Da mesma forma, diz, “o Tradutor Google
não é receado por tradutores profissionais competentes, ainda que possa ser
melhor do que alguns tradutores medíocres”.
A Automated Insights começou por lançar uma rede
de sites chamadaStatSheet (literalmente,
folha de estatísticas). Hoje, esta rede publica cerca de meio milhão de artigos
por ano sobre desporto profissional e ligas estudantis. Também vende serviços
de geração de textos a empresas de media como a CBS, o Yahoo, o USA Today e a
Bloomberg. “Mas a tecnologia é flexível para se adaptar a qualquer segmento
assente em dados estruturados, o que nos permite trabalhar numa variedade de
mercados: análise de negócio, finanças, imobiliário”, explica Adam Smith, um
dos vice-presidentes. Isto significa que também têm com clientes empresas que
precisam de escrever análises financeiras ou relatórios de vendas apenas para
consumo interno.
Dados estruturados é o jargão para o tipo de
informação organizada – por exemplo, numa tabela ou base de dados. Pode
ser seja uma ficha de jogo ou um folha de Excell com informação sobre venda de
casas numa cidade. Mas Smith garante que a tecnologia já consegue trabalhar com
dados não estruturados “desde que sejam consistentes” (por exemplo, que estejam
em documentos PDF cujo texto obedeça a um padrão pré-definido).
A tecnologia destas empresas não é feita apenas
por cientistas e programadores. O fundador e director executivo, Robbie Allen,
é engenheiro de formação, mas já escreveu 12 livros. É também ele que co-dirige
o departamento de tecnologia e desenvolvimento, a par de Joe Procopio, um
híbrido de engenheiro e colunista de tecnologia, cujos artigos são publicados
em vários órgãos de comunicação. “É uma mistura de desenvolvimento de software
e de experiência de escrita”, not Smith. A equipa que dirigem incluí analistas,
especialistas em estatística e escritores.
Numa entrevista à revista Wired, o director
executivo da Narrative Science (a empresa não respondeu a um pedido de
entrevista do PÚBLICO) disse acreditar que no futuro 90% das notícias serão
escritas por programas de computador. Mas não porque os jornalistas serão
substiuídos por máquinas. Antes porque a tecnologia de escrita de notícias por
algoritmos vai permitir, de forma barata. cobrir eventos e temas de nicho a que
nenhum jornalista presta atenção.
Edward Tenner diz haver até vantagens neste tipo
de tecnologia e dá o exemplo de como os xadrezistas usam computadores
para treinar e melhorar a respectiva técnica. Estes algoritmos-escritores,
defende, podem lembrar os jornalistas de que não há grande valor acrescentado
em textos que sigam as fórmulas tradicionais de escrita e levá-los a tentar
"atrair a atenção dos leitores com a qualidade e a originalidade da
pesquisa e da escrita".
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