terça-feira, 21 de junho de 2011

Também Platão odiaria o Facebook // by @PauloQuerido

Sempre que se inventou e aperfeiçoou uma nova tecnologia de comunicação, alguém clamou o fim dos tempos em geral e da Humanidade em particular, vergastada pelos efeitos devastadores dos demoníacos aparelhos.



O fenómeno não é propriamente novo. Pelo contrário, repete-se há pelo menos 2.400 anos: o Facebook de Platão foi a escrita. O filósofo grego argumentava que, ao contrário do seu autor, uma carta não podia manter uma conversa; quando inquirida, daria invariavelmente a mesma resposta. Ora, como o conhecimento só se produz a partir da interação humana, Platão concluiu, com o habitual brilhantismo que as elites reservam ao que é intransponível para os seus intelectos, que a palavra escrita ameaçava os laços humanos, condenando-nos a um futuro ignorante.
Não digo que não. Alguma qualidade do relacionamento entre as pessoas se perdeu com a palavra escrita; infelizmente, não registámos qual.
Num romance de 1880, recordou no mês passado o escritor Michael Chorost, a páginas tantas dois personagens que mantinham um escaldante romance através do telégrafo — o Twitter dessa época — interrogam-se sobre se a sua relação seria “real”. Chorost teoriza num novo livro sobre a emergência da Internet como um novo sistema nervoso para a Humanidade, levando-a a reconectar-se de formas novas, mais profundas.
Talvez seja útil contextualizar, invocando a neutralidade das ferramentas. A prensa de Gutenberg, o telégrafo de Henry e Morse, o telefone de Bell, a rádio de Tesla (ou Marconi), a televisão e a Internet tanto serviram finalidades admiráveis como vis. Porque vil, como admirável, é o ser humano. Mas, contas feitas, ficámos melhores com elas.
Se um casamento não resiste aos efeitos de uma conversa no Facebook — versão moderna do adro da igreja ao domingo –, é mais fácil encontrar o problema no casal. Admito que seja também mais incómodo. Como a caneta para Platão. Mas o que seria dele, e da sua memória e ensinamentos, se a sua conclusão fosse verdadeira?
Paulo Querido 

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Princípios da Democracia Ateniense


O que é a democracia?

O termo ‘democracia’ decompõe-se em:
‘Demos” = Povo
‘Cracia’ = Governo

Assim, a definição etimológica  do termo democracia será: 

‘Governo do povo’.
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A democracia surgiu na Grécia antiga em 508 a.c.

Esta forma de governo baseava-se nos seguintes princípios:

Isocracia 

“É o ideal da igualdade de acesso aos cargos políticos. Foi usado na Grécia Antiga, assim todos os cidadãos atenienses tinham o direito e o dever de participar na vida política da Pólis. As decisões normalmente tomadas em conjunto respeitavam a vontade da maioria, pois todos tinham igual direito de voto.” wikipedia
Isocracia significa ‘igualdade no acesso ao poder’ (kratos) e implica que todos os cidadãos tenham não apenas o direito e obrigação de eleger os seus chefes, mas também que eles próprios possam vir a ser eleitos para desempenhar funções nos diferentes órgãos existentes na pólis.

Isonomia

Isonomia é o conceito mais importante, na medida em que acaba por englobar os restantes e, por isso, ocorre nas fontes antigas como sinónimo do tipo de constituição que coloca o poder no demos ou ‘povo’ (i.e. a democracia). Isonomia significa, à letra, ‘igualdade perante a lei’ (nomos). Em consequência, todas as pessoas que detêm o estatuto de cidadão devem poder gozar dos mesmos direitos previstos na lei, entendida como expressão da vida em comunidade (pólis) e que representa, por isso, a garantia de estabilidade no interior dessa mesma comunidade.

Isegoria

Isegoria, pode ser traduzida por ‘igualdade no acesso à palavra’ ou, para usarmos a expressão consagrada, ‘liberdade de expressão’. Tratava-se de uma prerrogativa fundamental para o exercício activo da cidadania na assembleia, no conselho e nos tribunais ou então, numa equivalência mais directa do termo, naquele que era o espaço por excelência da intervenção pública: a ágora.

E os Gregos anunciavam esse direito através do recurso a uma fórmula breve, cuja sonora simplicidade ainda hoje continua válida e eficaz: «Quem deseja usar a palavra?».



terça-feira, 24 de maio de 2011

Tribo da Amazónia vive sem calendários e noção do tempo e da idade



Esta é a comunidade perfeita para quem está sempre atrasado ou não gosta de revelar a idade. Cientistas britânicos descobriram uma tribo amazónica que não tem noção do tempo ou de datas. Assinalam transição para a idade adulta passando o nome para um recém-nascido.


A tribo Amondawa vive no interior da floresta amazónica, no Brasil, e não tem relógios ou calendários. A única noção do tempo passa por distinguir o dia da noite e a época das chuvas da época seca.

Como não são contados os anos, a população da tribo não tem idade e assinala a transição da infância para a vida adulta mudando de nome. Uma criança dá o seu nome a um irmão recém-nascido e assume uma nova identidade.

A equipa de investigadores, liderada pela universidade de Portsmouth, Reino Unido, afirmou que esta é a primeira vez que se consegue provar que o tempo não é um conceito humano profundamente enraizado, como se pensava anteriormente.

"Podemos dizer sem qualquer dúvida que há pelo menos uma língua e uma cultura que não tem noção do tempo como algo que pode ser medido ou contado" afirmou Chris Sinha, um dos investigadores.

"A tribo Amondawa vive num mundo dirigido por eventos e não pela passagem do tempo", acrescenta o investigador, em declarações à BBC.

Apenas descoberta em 1986, a tribo Amondawa continua a ter o mesmo estilo de vida tradicional, sobrevivendo da caça, pesca e agricultura. Tem também uma língua própria, que funciona por um sistema de números que vai apenas até ao quatro.

Chris Sinha e a sua equipa, que incluía linguistas e antropologistas, passou oito semanas com os Amondawa e tentou perceber se a linguagem da tribo assumia conceitos como "na próxima semana" ou "no ano passado".

Os investigadores concluíram que na língua Amondawa estes conceitos não existem, mas sim apenas divisões de dia e noite, épocas chuvosas ou de seca.

"Para estas pessoas, tempo não é dinheiro, não estão sempre a correr contra o relógio para terminar algo e ninguém discute sobre a próxima semana ou o próximo ano. Nem sequer têm palavras como semana, mês ou ano", refere Chris Sinha.

"Podemos mesmo dizer que os Amondawa desfrutam de uma certa liberdade", conclui o investigador.

Jornal de Notícias



23/05/2011

quarta-feira, 16 de março de 2011

Liberdade de expressão nos EUA não cobre incitamento ao suicídio

William Melchert-Dinkel, um enfermeiro americano de 48 anos, foi considerado culpado por um Tribunal do Estado de Minnesotta de encorajar, a partir de fóruns online, duas pessoas a suicidarem-se.

Melchert-Dinkel, que arrisca uma pena de prisão de 15 anos, navegava em fóruns na Internet fazendo-se passar por uma enfermeira que explicava, passo a passo, quais as melhores e mais eficazes formas de cometer suicídio.
Mark Drybrough, britânico de 32 anos e Nadia Kajouji, canadiana com apenas 17 anos, foram dois dos cibernautas que ouviram os “conselhos” de Dinkel.
De acordo com a sentença do juiz Thomas Neuville, parcialmente transcrita pelo “El País”, “Melchert-Dinkel aconselhou intencionalmente Mark Drybrough, de Coventry, Inglaterra, (...) sobre como suicidar-se. Mark Drybrough, com efeito, pôs fim à sua vida a 27 de Julho de 2005... Melchert Dinkel aconselhou como suicidar-se e incitou a fazê-lo Nadia Kajouji, nascida a 6 de agosto de 1989, em Ottawa, no Canadá. Nádia Kajouji suicidou-se a 10 de Março de 2008.”
Este caso obrigou os EUA a ponderar sobre os limites da liberdade de expressão, valor altamente defendido no país e consagrado na primeira emenda da Constituição.
O tribunal acabou por decidir que a intenção criminosa de William Melchert-Dinkel tinha primazia sob a sua liberdade de expressão na Internet, fazendo desta decisão a primeira do género já que é a primeira vez que um juiz norte-americano considera alguém culpado de um delito desta índole cometido através da Internet e com efeitos fora das fronteiras nacionais dos EUA.
O advogado do arguido, Terry Watkins, tentou evitar este veredicto alegando que não só o enfermeiro estava a exercer o seu direito à liberdade de expressão, como de qualquer maneira, os suícidos tinham ocorrido no Reino Unido e no Canadá, países onde as leis do Minnesota sobre a assitência ao suicídio não teriam efeito. O advogado acrescentou que a decisão das vítimas estava já tomada anteriormente.
Mas o magistrado não se mostrou convencido com as alegações de Watkins, sublinhando que o arguido não estava meramente a promover ideias sobre suicídio, mas sim a incitá-lo, directa e intencionalmente, e que a predisposição das vítimas para cometer suicídio não era um argumento de defesa válido.
O anjo da morte, como Dinkel já é chamado pela imprensa, é pai de duas jovens e está já proibido de utilizar a Internet sem autorização judicial.
O caso de William Melchert-Dinkel, cuja duração da pena de prisão deverá ser determinada durante as próximas semanas, levanta nos EUA o debate sobre os limites daquele que é um direito de geometria variável, a liberdade de expressão.

|Fonte: Público online - 16.03.2011

terça-feira, 1 de março de 2011

O conhecimento como crença verdadeira justificada


O problema da origem do conhecimento
Introdução

A epistemologia, também chamada teoria do conhecimento ou gnoseologia, é o ramo da filosofia interessado na investigação da natureza, fontes e validade do conhecimento. Entre as questões principais que ela tenta responder estão as seguintes: O que é o conhecimento? Como nós o alcançamos? Podemos conseguir meios para defendê-lo contra o desafio céptico? Essas questões são, implicitamente, tão velhas quanto a filosofia.
Um passo óbvio na direcção de responder à primeira questão é tentar uma definição de conhecimento. A definição padrão, preliminarmente, é a de que o conhecimento é crença verdadeira justificada. Esta definição parece plausível porque, ao menos, ela dá a impressão de que para conhecer algo alguém deve acreditar nele, que a crença deve ser verdadeira, e que a razão de alguém para acreditar deve ser satisfatória à luz de algum critério, pois alguém não poderia dizer conhecer algo se a sua razão para acreditar fosse arbitrária ou aleatória. Assim, cada uma das três partes da definição parece expressar uma condição necessária para o conhecimento, e a reivindicação é a de que, tomadas em conjunto, elas são suficientes.

A origem do conhecimento
Paralelamente a esse debate sobre como definir o conhecimento há um outro sobre como o conhecimento é adquirido. Na história da epistemologia tivemos duas principais escolas de pensamento sobre o que constitui o meio mais importante para o conhecer. Uma é a escola "racionalista", que mantém que a razão é responsável por esse papel. A outra é a "empirista", que mantém que é a experiência, principalmente o uso dos sentidos, ajudados, quando necessário, por instrumentos, que é responsável por tal papel.
O paradigma de conhecimento para os racionalistas é a matemática e a lógica, onde verdades necessárias são obtidas por intuição e inferência racionais. Questões sobre a natureza da razão, a justificação da inferência e a natureza da verdade, especialmente da verdade necessária, são um desafio para esta corrente.
O paradigma dos empiristas é a ciência natural, onde observações e experimentações são cruciais para a investigação.

Definição de Conhecimento
A definição de conhecimento já mencionada – o conhecimento é uma crença verdadeira justificada - é entendida como uma análise do conhecimento no sentido proposicional. A definição é obtida perguntando que condições têm de ser satisfeitas quando queremos descrever alguém como conhecendo algo. Ao dar a definição enunciamos o que esperamos que sejam as condições necessárias e suficientes para a verdade da afirmação "S sabe que p", onde "S" é o sujeito epistémico, o suposto conhecedor, e "p" a proposição.
Parece correcto esperar que se S sabe que p, então p deve, ao menos, ser verdadeira. Parece certo esperar que S deve não meramente supor ou esperar que p é o caso, mas que deve ter um atitude epistémica positiva em relação a p: S deve acreditar que ela é verdadeira. E se S acredita em alguma proposição verdadeira enquanto ela não tem nenhum fundamento, ou fundamentos incorretos, ou meramente fundamentos arbitrários ou imaginários, não diríamos que S conhece p; querendo dizer que S deve ter bases para acreditar que p, em algum sentido propriamente justificado de assim proceder.<…>.
Há uma perspectiva, chamada "infalibiismo", que oferece exactamente um tal recurso. Ela estabelece que se é verdadeiro que S conhece p, então S não pode estar enganado em acreditar em p, e portanto a sua justificação para acreditar em p garante a sua verdade. A afirmação é, em resumo, que alguém não pode estar justificado na crença de uma proposição falsa.
Essa perspectiva é rejeitada pelos "falibilistas", cuja afirmação é a de que alguém pode de facto ter uma justificação para acreditar em algum p embora ele seja falso.
| A. C. Grayling, Epistemology. Bunnin and others (editors); The Blackwell Companhion to Philosophy. Cambridge, Massachusetts: Blackwell Publishers Ltd, 1996. (texto adaptado).
A Teoria CVJ
Suponhamos que o conhecimento requer estas três condições. Será que isto é suficiente? Será que estas condições não são apenas separadamente necessárias, mas também conjuntamente suficientes? Chamarei CVJ à teoria que afirma que assim é. Esta teoria diz que ter conhecimento é a mesma coisa que ter crenças verdadeiras justificadas:
(CVJ) Para que qualquer indivíduo S e para qualquer proposição p, S conhece p se e somente se

1. S acredita em p
2. p é verdadeira
3. a crença de S em p está justificada

A Teoria CVJ afirma uma generalização. Diz o que é o conhecimento para qualquer pessoa e para qualquer proposição p. Por exemplo,suponhamos que S és tu e que p = «A Lua é feita de queijo verde». A teoria CVJ diz o seguinte: se sabes que a Lua é feita de queijo verde, então os enunciados 1, 2 e 3 devem ser verdadeiros. E se não sabes que a Lua é feita de queijo verde, então pelo menos um dos enunciados de 1 a 3 deve ser falso. A a expressão «se, e somente se» diz-nos que são dadas condições necessárias e suficientes para o conceito definido.
Três Contra-Exemplos à Teoria CVJ
Em 1963, o filósofo Edmund Gettier publicou dois contra-exemplos para a teoria CVJ. O que é um contra-exemplo? É um exemplo que contradiz o que diz uma teoria geral. Um contra-exemplo contra uma generalização mostra que a generalização é falsa. A teoria CVJ diz que todos os casos de crença verdadeira justificada são casos de conhecimento. Gettier pensa que estes dois exemplos mostram que um indivíduo pode ter uma crença verdadeira justificada mas não ter conhecimento. Se Gettier tiver razão, então as três condições indicadas pela teoria CVJ não são suficientes.
Eis um dos exemplos de Gettier:
Smith trabalha num escritório. Ele sabe que alguém será promovido em breve. O patrão, que é uma pessoa em quem se pode confiar, diz a Smith que Jones será promovido. Smith acabou de contar as moedas no bolso de Jones, encontrando aí 10 moedas. Smith tem então boas informações para acreditar na seguinte proposição:

a) Jones será promovido e Jones tem 10 moedas no bolso.
Smith deduz, então, deste enunciado o seguinte:
b) O homem que será promovido tem 10 moedas no bolso.

Suponha-se agora que Jones não receberá a promoção, embora Smith não o saiba. Em vez disso, será o próprio Smith a ser promovido. E suponha-se que Smith também tem dez moedas dentro do bolso. Smith acredita em b, e b é verdadeira. Gettier afirma também que Smith acredita justificadamente em b, dado que a deduziu de a. Apesar de a ser falsa, Smith tem excelentes razões para pensar que é verdadeira. Gettier conclui que Smith tem uma crença verdadeira justificada em b, mas que Smith não sabe que b é verdadeira.
O outro exemplo de Gettier exibe o mesmo padrão. Um sujeito deduz validamente uma proposição verdadeira a partir de uma proposição que está muito bem apoiada por informações, embora esta seja falsa, apesar de o sujeito não o saber. Quero agora descrever um tipo de contra-exemplo à teoria CVJ na qual o sujeito raciocina não dedutivamente.
O filósofo e matemático britânico Bertrand Russell (1872-1970) refere um relógio muito fiável que está numa praça. Esta manhã olhas para ele para saber que horas são. Como resultado ficas a saber que são 9.55. Tens justificações para acreditar nisso, baseado na suposição correcta de que o relógio tem sido muito fiável no passado. Mas supõe que o relógio parou há exactamente 24 horas, apesar de tu não o saberes. Tens a crença verdadeira justificada de que são 9.55, mas não sabes que esta é a hora correcta.
Que Têm os Contra-Exemplos em Comum?
Em todos estes casos, o sujeito tem dados para acreditar na proposição em causa que são altamente credíveis, mas não infalíveis. O patrão está geralmente certo sobre quem vai ser promovido, o relógio está geralmente certo quanto às horas. Mas é claro que geralmente não é sempre. As fontes da informação que os sujeitos exploraram nestes exemplos são altamente credíveis, mas não são perfeitamente credíveis. Todas as fontes de informação eram susceptíveis de erro, pelo menos até certo ponto.
Será que estes exemplos refutam realmente a teoria CVJ? Depende de como entendemos a ideia de justificação. Se dados altamente credíveis são suficientes para justificar uma crença, então estes contra-exemplos refutam realmente a teoria CVJ. Mas se a justificação requer dados perfeitamente infalíveis, então estes exemplos não refutam a teoria.
A minha opinião é de que os dados que justificam uma crença não precisam de ser infalíveis. Penso que podemos ter crenças racionais bem apoiadas mesmo quando não nos empenhamos em estar absolutamente certos de que o que acreditamos é verdadeiro. Assim, concluo que a crença verdadeira justificada não é suficiente para o conhecimento.
|Elliott Sober. Tradução de Paula Mateus. Texto retirado do livro Core Questions in Philosophy, de Elliott Sober (Prentice Hall, 2008), in http://criticanarede.com/fil_con

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Actividades:
1. Tendo em conta que se apresentam como respostas para o problema da origem do conhecimento, defina o racionalismo e o empirismo.
2. Defina o infalibilismo e o falibilismo.
3. Tente relacionar o falibilismo e o infalibilismo com o racionalismo e o empirismo.
4. O conhecimento pode ser definido, de forma geral, como crença verdadeira justificada? Justifique a sua resposta com base nos contra-exemplos de Gettier.
5. Formule dois contra-exemplos à teoria CVJ.


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terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Declaração universal dos deveres humanos


Ainda no início do novo ano, fica aí uma síntese da célebre "Declaração universal dos deveres humanos". Para superar a crise e para que a esperança não seja mera ilusão, wishfull thinking, precisamos todos de ser fiéis às nossas responsabilidades e cumprir os nossos deveres.
Já na discussão do Parlamento revolucionário de Paris sobre os direitos humanos, em 1789, se tinha visto que "direitos e deveres têm de estar vinculados", pois "a tendência para fixar-se nos direitos e esquecer os deveres" tem "consequências devastadoras".
Foi assim que, em 1997 e após debates durante dez anos, o Interaction Council (Conselho Interacção) de antigos chefes de Estado e de Governo, como Maria de Lourdes Pintasilgo, V. Giscard d'Estaing, Kenneth Kaunda, Felipe González, Mikhail Gorbachev, Shimon Peres, fundado em 1983 pelo primeiro- -ministro japonês Takeo Fukuda, sob a presidência do antigo chanceler alemão Helmut Schmidt, propôs a Declaração Universal dos Deveres Humanos. Na sua redacção, teve lugar destacado o teólogo Hans Küng.
O Preâmbulo sublinha que: o reconhecimento da dignidade e dos direitos iguais e inalienáveis de todos implica obrigações e deveres; a insistência exclusiva nos direitos pode acarretar conflitos, divisões e litígios intermináveis, e o desrespeito pelos deveres humanos pode levar à ilegalidade e ao caos; os problemas globais exigem soluções globais, que só podem ser alcançadas mediante ideias, valores e normas respeitados por todas as culturas e sociedades; todos têm o dever de promover uma ordem social melhor, tanto no seu país como globalmente, mas este objectivo não pode ser alcançado apenas com leis, prescrições e convenções. Nestes termos, a Assembleia Geral proclama esta Declaração, a que está subjacente "a plena aceitação da dignidade de todas as pessoas, a sua liberdade e igualdade inalienáveis, e a solidariedade de todos", seguindo-se os seus 19 artigos, de que se apresenta uma síntese.
1. Princípios fundamentais para a humanidade. Cada um/a e todos têm o dever de tratar todas as pessoas de modo humano, lutar pela dignidade e auto-estima de todos os outros, promover o bem e evitar o mal em todas as ocasiões, assumir os deveres para com cada um/a e todos, para com as famílias e comunidades, raças, nações e religiões, num espírito de solidariedade: não faças aos outros o que não queres que te façam a ti.
2. Não violência e respeito pela vida. Todos têm o dever de respeitar a vida. Todo o cidadão e toda a autoridade pública têm o dever de agir de forma pacífica e não violenta. Todas as pessoas têm o dever de proteger o ar, a água e o solo da terra para bem dos habitantes actuais e das gerações futuras.
3. Justiça e solidariedade. Todos têm o dever de comportar-se com integridade, honestidade e equidade. Dispondo dos meios necessários, todos têm o dever de fazer esforços sérios para vencer a pobreza, a subnutrição, a ignorância e a desigualdade, e prestar apoio aos necessitados, aos desfavorecidos, aos deficientes e às vítimas de discriminação. Todos os bens e riquezas devem ser usados de modo responsável, de acordo com a justiça e para o progresso da raça humana.
4. Verdade e tolerância. Todos têm o dever de falar e agir com verdade. Os códigos profissionais e outros códigos de ética devem reflectir a prioridade de padrões gerais como a verdade e a justiça. A liberdade dos media acarreta o dever especial de uma informação precisa e verdadeira. Os representantes das religiões têm o dever especial de evitar manifestações de preconceito e actos de discriminação contra as pessoas de outras crenças.
5. Respeito mútuo e companheirismo. Todos os homens e todas mulheres têm o dever de demonstrar respeito uns para com os outros e compreensão no seu relacionamento. Em todas as suas variedades culturais e religiosas, o casamento requer amor, lealdade e perdão e deve procurar garantir segurança e apoio mútuo. O planeamento familiar é um dever de todos os casais. O relacionamento entre os pais e os filhos deve reflectir o amor mútuo, o respeito, a consideração e o cuidado.
Anselmo Borges, www.dn.pt - 12/02/2011

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Vivemos numa época de esquecimento de verdades fundamentais que são o património mais precioso da civilização ocidental. Uma civilização que vive um ocaso difícil de enfrentar com una intencionalidade histórica virada para o futuro. Porque o que conforma hoje as vias de compreensão do mundo e do homem é o fechamento ao novo e ao Diferente.
É o ocaso do Pensamento emancipador e da acção libertária.
Do ponto de vista político assume-se como natural a destruição das conquistas civilizacionais levadas a cabo pelos trabalhadores, à custa de muito sofrimento, de mortes, de repressão, de lutas que custaram demasiado caro aos que nos precederam para hoje não sabermos dar continuidade ao esforço de dignificação dos homens, seja qual for a sua condição, encarados como agentes de mudança cultural.
Hoje procura reduzir-se a densidade cultural do trabalho à mera actividade de produção, sem que se considere o trabalhador como um sujeito ético, portador de direitos e agente deontológico com um papel determinante na construção duma sociedade mais humana e mais aberta à transformação civilizadora.
Há um empobrecimento do conceito de cidadania, reduzido quase à sua acepção económica e expurgado de qualquer dimensão espiritual.
A classe dirigente parece ignorar, por exemplo, que o desemprego que atinge números humanamente incomportáveis tanto em Portugal com nos restantes países do primeiro mundo, não é um problema que se possa resolver no actual quadro sócio-político. O desemprego é estrutural e não regredirá significativamente se houver crescimento económico.
Há que mudar de paradigma. Em vez de se diabolizar os trabalhadores da Função Pública, há que repensar o papel do Estado na criação de emprego social. As áreas da educação, da saúde, da solidariedade social, são deficitárias em termos de pessoal qualificado para apoio às pessoas, tenham elas necessidades específicas ou não.
É irracional termos um Estado que forma milhares de licenciados por ano para os condenar ao desemprego.
Aquilo que a classe governante está a fazer aos professores contratados, por exemplo, é mais do que criminoso. Quem pode arroga-se o direito de tratar outros seres humanos como meros recursos que podem ser usados, e descartados, sem atender à sua dignidade e à excelência ética do exercício das suas funções? Isto vale para todas as profissões, para todos os seres humanos.
Fala-se das escassez de recursos para alimentar um Estado-providência cada vez mais gastador. O que deve ser encarado com toda a frontalidade é a necessidade de se assumir que é necessária uma mudança de paradigma sócio-cultural. Há que repensar prioridades. O que é prioritário é melhorar a equidade na distribuição da riqueza produzida pela sociedade, dando valor ao trabalho e às pessoas, consideradas na sua radicalidade existencial e sem as reduzir a meros recursos a serem usados de forma abusiva e eticamente degradante.
Isto só é possível elevando o nível da participação democrática dos cidadãos.
Em democracia não deve haver factos consumados ou qualquer tipo de determinismo económico que ponha em causa a soberania do povo. Isto no plano ideal. Porque na prática assistimos à imposição dum totaliarismo atroz à vontade soberana dos povos que pretendem viver em democracia.
É um imperativo ético que o pensamento emancipador, na sua vertente filosófica, mas também estética, científica e espiritual, num sentido alargado, possa elevar-se como uma via de clarificação política. Em primeiro lugar, denunciando os dispositivos de dissuasão que impedem a tomada de consciência do enclausuramento totalitário e mantêm os cidadãos afastados do seu poder efectivo de se assumirem como agentes de mudança.
Neste sentido, a consciência da importância dos deveres como o garante do usufruto dos direitos é verdadeiramente revolucionária, porque coloca cada ser humano no papel de agente e não apenas de usufrutuário dum estatuto eticamente amorfo.
O ser, legitimado no campo político por um dever-ser instaurador duma mundividência orientada para a autonomia e para a participação empenhada na vida colectiva, é o que se torna necessário nesta época em que parece imperar a abdicação e o exílio histórico da cidadania responsável.
A melhor forma de lutarmos contra a corrupção é sermos incorruptíveis. O autêntico governo, a verdadeira soberania, é o exercício do poder-ser que emerge da nossa liberdade espiritual, a nossa esfera de auto-determinação. Sempre podemos fazer um pouco mais no que se refere ao alargamento das nossas capacidades de acção e de compreensão.
Paulo Feitais
Publicado originariamente no blogue: Mãos abertas - Sonhos à solta

iPlatão

Os ensinamentos dos grandes filósofos adaptados à era da internet.

Uma pertinente reflexão sobre o mundo actual e sobre os ensinamentos dos principais filósofos da Antiguidade deram origem à obra iPlatão, um livro sobre o significado da vida há dois mil anos e a respectiva conexão com o mundo moderno. Segundo o autor, Mark Vernon, jornalista e escritor reconhecido com mais de uma dezena de livros publicados, a mensagem de Sócrates, Epicuro, Diógenes, Zenão, entre outros, é intemporal.

É possível retirar ensinamentos das teorias dos grandes filósofos antigos, mesmo em pleno século XXI, defende Mark Vernon, autor deiPlatão, um livro sobre a actualidade e pertinência dos pensamentos dos grandes filósofos da Grécia Antiga.

Escrito de forma simples e acessível, o livro de Mark Vernon, que já foi sacerdote, reflecte sobre o que é realmente relevante hoje em dia e sobre o que cada mestre pode ensinar ao mundo moderno.