domingo, 2 de outubro de 2016

Aprender a filosofar: as questões filosóficas


As questões filosóficas

_________
“Pensar por si próprio, é antes de mais colocar-se questões. Ganhemos então o hábito de colocar pontos de interrogação no fim das nossas frases, para deixar sempre aberta a meditação e permitir que ela floresça.”
Michel Tozzi, Penser par soi-même, p. 58

Na sua obra, Crítica da capacidade de julgar, o filósofo alemão Kant (sec.XVIII) expõe três máximas que mostram com clareza a natureza da atividade filosófica: 
            “1. Pensar por si mesmo;
             2.Pensar colocando-se no lugar do outro;
             3. Pensar sempre de acordo consigo mesmo.

A primeira máxima é a do pensamento livre de preconceitos, a segunda máxima é a do pensamento alargado, a terceira máxima é a do pensamento consequente” (KANT, Crítica da Faculdade de Julgar § 40).
__________

Nem todas as questões são filosóficas

Podemos agrupar todas as questões possíveis sob cinco categorias distintas, questões:
(1) de ser;
(2) de lugar;
(3) de tempo;
(4) de ordem;
(5) de causa;
(6) de finalidade.

(1) O que? Quem? Qual? O que é? O que é isso/o que é isto? 
Questões de ser, de identidade, de existência de um sujeito ou de um objecto. (O célebre “ser ou não ser” de Shakespeare).
A questão “o que é x?” foi considerada por Sócrates e Platão a questão filosófica por excelência, porque nos obriga a “mergulhar” na natureza das coisas (no significado profundo dos conceitos). É um tipo de questão que não nos deixa fugir aos assuntos.

(2) Onde? (Onde é que foi(será)?/ Onde é que se passou(passará)?/ Onde aconteceu (acontecerá)?).
Questões de lugar, de espaço.

(3) Quando? (Quando é que?).
Questões de tempo.

(4) Como? (Como se deu isso?/Como aconteceu?).
Questões de ordem, de procedimento, de organização, de envolvimento.
As questões deste tipo são uma combinação de “onde?” e “quando?”.

(5) Porquê? (Por que é que?).
Questões de causa, de sentido, de origem.
É a  questão mais perturbadora uma vez que a resposta pode gerar ainda e sempre um novo “porquê?” Ela só desaparece face ao humor e aos limites da nossa imaginação. Ela conduz-nos por vezes ao impasse da referência circular como no problema do ovo e da galinha. Ela pode comportar também uma armadilha ilusória: o simples facto de a formular deixa pensar que uma resposta é possível.

(6) Para quê? Com que intenção?
Questões de intencionalidade, que visam especialmente as ações humanas e as intenções que a elas presidem. Os filósofos finalistas consideram que existe uma finalidade (intencionalidade), divina ou racional, nos fenómenos naturais, questionando-os de forma aproximável ao questionamento em torno das ações humanas. Pode dizer-se que este tipo de questão é uma derivação das questões de causa (5).




O que é que distingue as questões filosóficas?

Devem estar reunidas três condições para que uma questão possa ser considerada filosófica:

(1) A sua forma interrogativa torna possíveis várias respostas credíveis.
Uma questão que só tem uma só resposta possível é de ordem prática – factual (f); científica (c); técnica (t) ou jurídica (j) – ou religiosa (r) (dogmática, fanática – [nos casos extremos]). Pelo contrário, a questão filosófica (fil), como um funil invertido, esboça-se sobre uma abertura larga, ela permite uma perspectiva alargada, ela é um ponto de partida, enquanto as questões de ordem prática ou religiosa conduzem a um só ponto dado, a um acabamento (a uma meta final).

(2) Elas interrogam a razão a um nível de generalidade e de universalidade que diz respeito a todos os homens.
Uma questão que diz respeito apenas a um indivíduo, ou a um só grupo, sai do quadro da filosofia porque não é universal. Ela exige uma resposta específica (factual ou jurídica) que se aplica a dada situação. A questão “o que sou eu?” pode ter um alcance filosófico ou não dependendo de nos ser colocada por um agente fronteiriço (“Quem é você? [Qual é a sua identificação?]) ou um filósofo (Quem somos nós? [O que somos nós? O que é o homem?]).

(3) Elas articulam-se através das noções abstratas da linguagem.

A linguagem permite a expressão do pensamento, o que não quer dizer que o pensamento seja anterior à linguagem: podemos pensar porque podemos falar (sem linguagem não haveria pensamento). Consequentemente, todas as questões filosóficas exprimem-se através de frases. Mas nem nem todos os discursos (tudo o que dizemos) exprimem um pensamento filosófico. Isso depende da sua formulação.


François Brooks
http://www.philo5.com/Penser%20par%20soi-meme/Les%20questions%20philosophiques.htm

Sem comentários:

Enviar um comentário