quinta-feira, 31 de outubro de 2013

O Juízo (a Proposição)

Definição de Juízo.
Chama-se juízo ao acto do pensamento que consiste na atribuição afirmativa ou negativa de um atributo (Predicado), a um conceito (Sujeito), através de um elemento de ligação (Cópula)
O juízo tem assim uma estrutura triádica, fazendo-nos lembrar que a palavra latina ‘pensare’, que está na origem da nossa palavra ‘pensar’, significa pesar, ou seja, comparar uma coisa com outra (a medida), para daí retirar o conhecimento de um seu atributo (ou característica), neste caso do seu peso. E é interessante vermos que o a estrutura formal do juízo se assemelha à de uma balança:
SUJEITO + CÓPULA + PREDICADO

"Alguns homens são europeus"

Definição de juízo categórico: um juízo diz-se categórico, quando a relação entre o sujeito e o predicado é afirmada ou negada sem condições ou restrições.

Classificação dos juízos quanto à quantidade e à qualidade:

Quanto à quantidade os juízos (proposições) podem ser particulares, quando o termo-sujeito é particular, e universais, quando o termo-sujeito é universal. No que diz respeito às inferências, na Lógica Clássica, os juízos com um termo-sujeito singular têm o mesmo valor lógico que os juízos universais, uma vez que os conceitos singulares ocorrem sempre na sua máxima extensão.

Quanto à qualidade, os juízos (proposições) podem ser afirmativos, quando a relação entre o sujeito e o predicado é afirmativa (inclusiva), e negativos, quando a relação entre o sujeito e o predicado é negativa (exclusiva).

Definição d1 - Numa proposição (juízo), um termo diz-se distribuído, quando ocorre na sua máxima extensão (universalmente).

           Dado o que ficou estabelecido, existem quatro tipos de juízos categóricos (proposições predicativas categóricas)
No quadro seguinte iremos apresentar esses quatro tipos de proposição, bem como os símbolos utilizados em Lógica para os denotar. É importante prestar muita atenção ao quadro, uma vez que iremos utilizar os símbolos nele apresentados, para nos referirmos a cada um dos tipos de proposição.

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Regra da distribuição dos termos  - Nas proposições universais, o termo-sujeito está sempre distribuído. Nas proposições negativas, o termo-predicado está sempre distribuído.
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De acordo com a Regra Rd1, podemos chegar à conclusão que nas proposições de tipo A, o termo-sujeito está distribuído; nas proposições de tipo O, o termo-predicado está distribuído; nas proposições de tipo E, tanto o termo-sujeito como o termo-predicado estão distribuídos:


Regra FnP Todos os enunciados utilizados nas inferências da Lógica Clássica devem estar reduzidos à sua Forma Normal ou Padrão. No caso das proposições, a sua Forma Normal compreende os seguintes elementos:
                   Quantificador+Sujeito+Cópula+Predicado.

 O quantificador é o elemento da proposição que nos indica a sua quantidade e ocorre sempre no início da proposição. Eis os quantificadores-padrão que vamos utilizar: Todos; Alguns; Nenhum.
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Actividades: 
1 - Identifique o tipo de proposição presente em cada um dos seguintes itens:
a) Nem todos os mortais são racionais.
b) Quase todas as mulheres detestam futebol.
c) Alguns homens são europeus.
d) Nenhum europeu gosta do Presidente Bush.
e) Praticamente todos os alunos gostam de Matemática.
1.1 -  Nos casos em que isso se justifique, reduza à forma normal predicativa os enunciados apresentados acima.

2 – Identifique que termo(s) está(ão) distribuído (s) nas seguintes proposições (sempre que se justificar, deve reduzir as expressões à forma normal predicativa).
a) Alguns homens são adeptos do FCP:
b) Quase todos os ignorantes detestam filosofia.
c) Todos os bons alunos gostam de lógica clássica.
d) Os adolescentes que vivem em localidades do litoral sentem-se mais atraídos pela prática do surf.
e) Alguns grupos de rock não agradam aos fãs da música popular portuguesa.

Trabalho Anual

ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO:
O trabalho  será faseado e partirá da seleção de um dos seguintes problemas:referenciadas no Programa de Filosofia (2001):

A. A inteligência artificial: computadores, pensamento e consciência de si.
B. A ética e a verdade aplicada à argumentação: a relação retórica/filosofia.
C. Política, Filosofia e Verdade.
D. A existência do mundo exterior.
E. Razão, Ciência e Verdade.
F. Os limites do conhecimento humano.

Esses problemas serão aprofundados com base na exploração das seguintes obras filosóficas:
Platão, Apologia de Sócrates; (Problemas B, C e F).
Descartes, Os Princípios da Filosofia;(Problemas B, D, E e F).
Bertrand Russell, Os Problemas da Filosofia;(Problemas D, E e F).
Searle, Mente, Cérebro e Ciência. (Problema A).
É possível a escolha de outras obras filosóficas, desde que previamente negociadas com o professor.

1ª fase: Trabalho escrito (versão inicial - 1º período)
2ª fase: Trabalho escrito / Ensaio (versão final - 2º período)
3ª fase: Apresentação oral do trabalho escrito (3º período)

O Conceito


A definição de Conceito – Os conceitos como os elementos constitutivos do pensamento

O pensamento desenvolve-se de acordo com três actos fundamentais do nosso espírito: a conceptualização (ou generalização representativa), o juízo e o raciocínio. A Lógica formal não se preocupa em saber quais as faculdades da mente que estão na base destes
três tipos de operações mentais, isso é uma tarefa para a Psicologia e para a Gnosiologia. O que lhe interessa é conhecer as suas características formais e estabelecer normas que permitam a sua correta articulação formal.
Conceptualizar significa criar uma representação mental de uma classe de objetos ou elementos da realidade externa ou interna. De uma forma mais rigorosa, podemos afirmar que na conceptualização estão envolvidos dois atos da mente: em primeiro lugar, a apreensão das características distintivas presentes num número significativo de elementos de uma classe de objetos pertencentes à realidade, seguida da generalização dessas características, incluindo-as numa representação abstrata das características comuns a todos os elementos dessa classe de objetos. 
Assim, podemos definir o conceito como: a representação abstrata da essência (natureza) de uma classe de objetos. Por exemplo, o enunciado ‘o homem é um animal racional’é a definição do conceito de ‘homem’, porque apresenta as características essenciais da classe dos homens: estas características estão presentes em todos os indivíduos humanos. Mas atenção: o que interessa à Lógica não são as realidades a que os conceitos se referem, mas as propriedades formais dos conceitos, e estas são duas: a 
extensão e a compreensão.

TEXTO

 “Os homens inventaram os conceitos para descrever o mundo que os rodeia. Muito cedo o homem descobriu que certos objetos, acontecimentos, processos e regiões possuíam características semelhantes. Então, agrupou os vários fenómenos em termos das semelhanças descobertas à base de tamanho, peso, localização no tempo e espaço, proveniência, função, etc. Os conceitos vão desde ideias sobre coisas muito simples até às abstrações de alto nível, bastante distanciadas do nível dos objetos concretos. 
O pensamento, o progresso e o desenvolvimento em todos os domínios da atividade humana dependem da exatidão dos nossos conceitos.
Os homens inventaram também símbolos para exprimir o significado dos conceitos. Os símbolos primitivos relacionavam-se de perto com os objetos originais, tais como os desenhos das cavernas, a primitiva escrita pictórica, os hieróglifos. Os modernos sistemas de linguagem vão desde o relativamente simples ao bastante complexo. O uso extensivo de símbolos é uma característica predominante das modernas culturas.
Os conceitos e os símbolos servem para a comunicação, mas são também vitais para o raciocínio e para a descoberta de novas relações. Não podemos pensar bem em qualquer campo de conhecimento sem conhecermos os conceitos sistemáticos em que esse campo assenta. Os níveis avançados em qualquer disciplina baseiam-se em conceitos complexos, especializados e muitas vezes difíceis de compreender.”
Burton, Kimbal e Wing, Anatomia do pensamento, p. 238-239.


A Extensão e a Compreensão do Conceito

Designa-se extensão de um conceito, o conjunto de indivíduos (entidades/objectos) a que o conceito se refere. A maior ou menor extensão de um conceito corresponde ao seu maior ou menor grau de generalidade ou à sua maior ou menor proximidade à singularidade. Assim, atendendo à sua extensão, os conceitos podem ser singulares, particulares, ou universais.

Os conceitos singulares, são aqueles que se referem apenas a um indivíduo. Por exemplo: 
‘Este homem’
‘Maria’.
‘O meu cão’.
‘Aquele autocarro’.

Os conceitos particulares, são aqueles que se referem a parte de uma classe de objectos:
‘Alguns homens’.
‘Alguns animais’.
‘A maioria dos automobilistas’.
‘Certas canetas’.

Os conceitos universais, são aqueles que se referem a todos os membros de uma classe de objectos:
‘Todos os homens’.
‘Os animais’.
‘Todos os cães’.
‘Todos os veículos’.


   
Designa-se compreensão de um conceito, o conjunto de características (dos objectos por ele denotadas) que nele estão representadas. Assim a compreensão do conceito de ‘Homem’, corresponde às características específicas ou essenciais da classe dos homens, ou seja, simplificando, às características comuns a todos os homens. 
Podemos então enunciar a regra da relação entre a compreensão e da extensão dos conceitos (RC1):



Regra RC1 – À medida que a extensão de um conceito cresce, a sua compreensão decresce, e inversamente.

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Os atos do pensamento e a sua expressão lógica

Devemos esclarecer a distinção lógica entre os actos do pensamento e a sua expressão em termos de linguagem formal: no caso do conceito, este é expresso na linguagem natural através da palavra. Como a Lógica se deve afastar o mais possível da ambiguidade polissémica da linguagem natural, o conceito é expresso através do termo. 
Assim, o termo corresponde à designação lógica do símbolo, ou conjunto de símbolos, que se convencionou utilizar para expressar um conceito. De igual modo, a expressão lógica de um juízo designa-se proposição, enquanto que a expressão lógica de um raciocínio tem a designação lógica de argumento. Por razões práticas, daqui para a frente poderemos referir-nos quer aos conceitos, juízos e raciocínios, quer aos termos, proposições e argumentos, ficando estabelecido que, do ponto de vista prático, é indiferente utilizarmos um ou outro tipo de designação. 
Para que se compreenda esta correspondência, consulte-se o seguinte quadro:



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Actividades:
                         1. O que são e para que servem os conceitos? Justifique.
                      2. Poderia existir o pensamento sem conceitos? Porquê?
                      3. Distinga a extensão e a compreensão dos conceitos.
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sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Teste 1 - Matriz

Objetivos:                                                                                                                                                                     
- Definir o conceito de Razão;
- Analisar a origem etimológica do termo ‘razão’: lógos e ratio;
- Identificar diversas acepções do termo ‘razão’; 
- Distinguir razão objetiva e razão subjetiva;
- Definir a verdade de acordo com a teoria da adequação;
- Explicar o princípio da razão suficiente;
- Analisar enunciados com base no princípio da razão suficiente;
- Problematizar o conceito de ordem (racional);
- Relacionar os seguintes conceitos: facto, lei científica e teoria científica;
- Identificar os princípios lógicos da razão.
- Analisar enunciados com base nos princípios lógicos da razão.
- Definir validade formal.
- Distinguir verdade e validade formal;
- Definir forma lógica;
- Definir a lógica;
- Distinguir a lógica enquanto ciência e enquanto arte;
- Compreender os principais objetivos da lógica;
- Definir argumento;
- Identificar os elementos dum argumento;
- Definir indução (argumento indutivo);
- Interpretar o conceito de validade indutiva;
- Definir dedução (argumento indutivo);
- Interpretar o conceito de validade dedutiva;
- Construir argumentos sólidos.

Problemas a explorar:

O que é que torna possível explicar a realidade?         Tudo é racional?
A Razão e a busca da verdade.                                           Porque existe o ser e não o nada?
A racionalidade tem limites?

Estrutura do teste:

Grupo I – I.1. Questões de escolha múltipla (12); 
Grupo II – Questões de resposta curta (definir; analisar; identificar; distinguir; comparar) – 5.
Grupo III – Uma questão de desenvolvimento – num mínimo de 300 palavras. (compreender; explicar; interpretar; relacionar; problematizar).
Cotações: Grupo I – 30% (6 valores); Grupo II – 40% (8 valores); Grupo III – 30% (6 valores). Pesos (questões dos grupos II e III): Exposição dos conteúdos (65%); Estruturação formal das respostas /Qualidade da argumentação (grupo III)(25%); Correção da Expressão Escrita (10%).

Instruções: Não será necessária folha de teste. 
                         O teste terá a duração de 90 minutos.
                         Nos grupos II e III deve ser original e crítico nas suas respostas.
                         Deve ler todo o enunciado antes de começar a responder.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

O que é a lógica?



Breve história da Lógica

A Lógica pode ser definida como, por um lado, a ciência que estuda as leis que regem a coerência do pensamento e do discurso.
Por outro lado, pode também ser considerada como a arte de pensar e argumentar com coerência e com método.
Enquanto ciência, a Lógica é uma disciplina teórica, verdadeiramente fundamental no que diz respeito a ciências como a Matemática, as Ciências da Computação e a Inteligência Artificial.
Como Arte de pensar com coerência, a Lógica revela a sua utilidade como uma via para disciplinar a mente e exercitar as capacidades racionais que, muitas vezes, descuramos e não utilizamos devidamente, para nosso prejuízo e daqueles que connosco têm que trocar argumentos.
Tendo sido fundada por Aristóteles (que lhe deu a designação de Analítica), a Lógica foi, ao
Aristóteles  384 a.C - 322 a.C.
longo da história do pensamento Ocidental, o palco de uma das maiores aventuras do pensar: a busca de um método comum a todos os saberes racionais, que permitisse estabelecer as bases definitivas da verdade acessível à Razão humana. A própria designação que os bibliotecários de Alexandria deram ao conjunto de tratados lógicos de Aristóteles – Órganon – é reveladora dessa demanda: órganon é uma palavra grega que significa instrumento. A Lógica foi, desde a sua fundação, considerada o instrumento das ciências ( ou melhor: das demonstrações científicas ). Esta ‘instrumentalização’ de uma disciplina filosófica levou a que, até ao Renascimento ( e, em muitos casos, para além dele), a Lógica fosse banalizada, transformada em mera arte mnemónica ( quer dizer: arte de memorizar ), sem qualquer espaço de manifestação da criatividade e da originalidade que caracteriza o exercício verdadeiramente filosófico da racionalidade.
Podemos afirmar, embora simplificando demais as coisas, que a história da Lógica está dividida em dois grandes períodos, que correspondem também a duas formas radicalmente distintas da sua sistematização: a Lógica Clássica e a Lógica Moderna. A assenta nos alicerces da analítica aristotélica – de facto, as inovações que foram sendo acrescentadas ao sistema aristotélico não introduziram mudanças dramáticas na sua estrutura, apenas a tornaram mais operacional e mais coerente. (Por esta razão é comum identificar a lógica clássica com a lógica aristotélica)
A Lógica Moderna, também designada como Lógica Simbólica, Lógica Matemática ou Logística nasceu da necessidade de construção de linguagens simbólicas artificiais, que pudessem expressar, de forma rigorosa, os conceitos e as operações do pensamento matemático. É que a Lógica Clássica estava demasiado dependente da estrutura gramatical da linguagem natural, fundamentalmente do grego clássico, não conseguindo ser, ao contrário da intenção de Aristóteles, verdadeiramente formal: mesmo separando a forma do pensamento do seu conteúdo, a lógica Clássica estando dependente da estrutura gramatical da linguagem natural, ‘contaminava’, por assim dizer, o pensamento com elementos que lhe são estranhos.
Esta necessidade de encontrar linguagens simbólicas completamente desligadas da linguagem natural e da sua vinculação à realidade material, capazes de permitir ao pensamento ultrapassar as barreiras que a linguagem natural lhe impõe, foi sentida principalmente no horizonte das matemáticas. É quase impossível actualmente conceber a possibilidade da não existência de uma linguagem simbólica seguida por todos os matemáticos. Mas era essa a situação que vigorou até ao início do século XX: não existia uma notação matemática uniformizada, o que dificultava, e muitas vezes impedia, o progresso no âmbito desta ciência. É um facto que muitos matemáticos não foram tão longe quanto poderiam ter ido por lhes faltar uma linguagem formalizada que pudesse conduzir o pensamento nos meandros mais intrincados das demonstrações mais complexas. No caso de Descartes, Pascal e Leibniz (grandes filósofos e matemáticos), por exemplo, temos a tentativa de encontrar sistemas simbólicos que pudessem servir às demonstrações matemáticas, mas sem sucesso.
Bertrand Russell 1872-1970
Foi em 1913 que foi publicada, por Bertrand Russell e A. N. Whitehead, a que foi considerada a obra mais revolucionária da história da Lógica: Principia Mathematica (Princípios da Matemática). Aí foi  apresentada à comunidade científica a notação que hoje é usada em Matemática, e foram estabelecidas as bases de uma Lógica verdadeiramente formal, a que se deu a designação de Lógica simbólica.
Hoje, a Lógica é a única disciplina filosófica que pode ser considerada uma ciência: ela é uma ciência cujo território se situa na confluência da Filosofia com a Matemática. É uma ciência transdisciplinar, que nos mostra que no saber racional, por mais rigoroso e formal, não há compartimentos estanques, porque a busca da verdade é o mais difícil dos intentos humanos, mas também o mais frutuoso.
Podemos afirmar que a noção tradicional de verdade inviabilizava o progresso do conhecimento científico e a evolução das sociedades humanas, no sentido de uma racionalidade civicamente radicada na convivialidade, tal como hoje é vivida nas sociedades democráticas. Se admitirmos que a verdade não é histórica e não admite mudanças, estamos a negar, ao mesmo tempo, a diversidade cultural como fenómeno antropologicamente decisivo e a possibilidade das teorias científicas poderem ser postas em causa e serem substituídas por teorias mais consistentes e que expliquem melhor os fenómenos.
A Lógica, ao estabelecer os princípios que fundam o uso correcto da razão, não decide o que se pode pensar, ou seja, o conteúdo do pensamento, mas antes como se deve pensar. Por exemplo: duas teorias científicas contraditórias têm que estar de acordo com esses princípios. A teoria da gravitação universal de Newton obedecia aos princípios lógicos da razão, tal como a teoria da relatividade de Einstein que substitui a primeira. Ambas as teorias são formas de aproximação à verdade, mas a de Einstein é mais consistente, pois
explica melhor o funcionamento da realidade, mas ambas são coerentes, ou seja, têm congruência lógica.
Sendo assim, a Lógica permite que a humanidade não fique entregue ao relativismo, pois garante a possibilidade de uma verdade que admite modificações, sempre com vista à expansão da racionalidade e à compreensão, cada vez mais profunda e abrangente, da realidade que, como é óbvio, envolve um alargamento da consciência que o homem tem do seu lugar no Universo.
Porque a Lógica não nos diz que verdades conhecer, antes procura estudar as bases da validade dos nossos argumentos.    
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O que é a Lógica?
Texto 1
Todos nós raciocinamos. Tentamos descobrir como as coisas são raciocinando com base naquilo que já sabemos. Tentamos persuadir os outros de que algo é de determinada maneira dando-lhes razões. A lógica é o estudo do que conta como uma boa razão para o quê, e porquê. Temos no entanto de compreender esta afirmação de um certo modo. Aqui estão dois trechos de raciocínio — os lógicos chamam-lhes inferências:

1.       Roma é a capital da Itália, e este avião aterra em Roma; logo, o avião aterra na Itália.
2.       Moscovo é a capital dos EUA; logo, não podemos ir a Moscovo sem ir aos EUA.

            Em ambos os casos as afirmações antes do «logo» — os lógicos chamam-lhes premissas — são as razões dadas; as afirmações depois do «logo» — os lógicos chamam-lhes conclusões — são aquilo que as razões devem sustentar. O primeiro trecho de raciocínio está correcto, mas o segundo é completamente descabido, e não iria persuadir ninguém com um conhecimento elementar de geografia: a premissa de que Moscovo é a capital dos EUA é, simplesmente, falsa. Note-se que, contudo, se a premissa fosse verdadeira — por exemplo, se os EUA tivessem comprado a Rússia toda (e não apenas o Alasca) e tivessem mudado a Casa Branca para Moscovo para estarem perto dos centros do poder Europeus — a conclusão seria de facto verdadeira. A conclusão ter-se-ia seguido da premissa; e essa é a preocupação da lógica. A lógica não se preocupa em saber se as premissas de uma inferência são verdadeiras ou falsas. Isso é o trabalho de outras pessoas (neste caso, do geógrafo). A lógica apenas está preocupada em saber se a conclusão se segue das premissas. Os lógicos chamam válidas a todas as inferências em que de facto a conclusão se segue das premissas. Assim, o objectivo principal da lógica é compreender a validade.
Graham Priest, Lógica, Temas e Debates, 2002 (Trad. Célia Teixeira), p.15-16
Texto copiado daqui.

Texto 2
Diz-se, por vezes, que a lógica é o estudo dos argumentos válidos; é uma tentativa sistemática para distinguir os argumentos válidos dos inválidos. Neste estádio, tal caracterização tem o defeito de explicar o obscuro em termos do igualmente obscuro. O que é afinal a validade? Ou, já agora, o que é um argumento? Para começar pela última noção, mais fácil, podemos dizer que um argumento tem uma ou mais premissas e uma conclusão. Ao avançar um argumento, damos a entender que a premissa ou premissas apoiam a conclusão. Esta relação de apoio é habitualmente assinalada pelo uso de expressões como “logo”, “assim”, “consequentemente”, “portanto, como vês”. Considere-se esse velho e aborrecido exemplo de argumento:

Sócrates é um homem.
Todos os homens são mortais.
Logo, Sócrates é mortal.

As premissas são “Sócrates é um homem” e “Todos os homens são mortais”. “Logo” é o sinal de um argumento e a conclusão é “Sócrates é mortal”.
A vida real nunca é tão evidente e inequívoca como seria se todas as pessoas falassem da maneira como falariam se tivessem lido manuais de lógica a mais numa idade facilmente impressionável. Por exemplo, muitas vezes avançamos argumentos sem apresentar todas as nossas premissas.

Icabod teve negativa.
Logo, não pode passar de ano.

Neste argumento está implícita aquilo a que chamamos uma premissa suprimida; nomeadamente, a de que nenhum estudante que tenha negativa passa de ano. Pode ser tão óbvio, pelo contexto, qual a premissa que está a ser pressuposta, que seja pura e simplesmente demasiado aborrecido formulá-la explicitamente. Formular explicitamente premissas que fazem parte do pano de fundo de premissas partilhadas é uma forma de pedantismo. Contudo, temos de ter em mente que qualquer argumento efectivamente usado pode ter uma premissa suprimida que tenha de se explicitar para que possa ser rigorosamente analisado. Em nome do rigor completo, praticaremos neste estudo um certo grau de pedantismo.
Regressaremos a outras questões acerca da natureza dos argumentos depois de uma primeira caracterização da noção de validade. Com este fim em vista, considere- se os seguintes pequenos argumentos simples:

I
O céu é azul e a relva verde.
Logo, o céu é azul.

Todos os estudantes do Balliol College são inteligentes.
Icabod é um estudante do Balliol College.
Logo, Icabod é inteligente.

II
Ou o céu é azul, ou a relva é cor de laranja.
Logo, a relva é cor de laranja.

Icabod é inteligente.
Icabod estuda no Balliol College.
Logo, todos os estudantes do Balliol College são inteligentes.
Há qualquer coisa de infeliz nos argumentos apresentados no grupo II. Podemos imaginar contextos nos quais as premissas seriam verdadeiras e a conclusão falsa. Os argumentos do grupo I têm conclusões verdadeiras sempre que têm premissas verdadeiras. Diremos que são válidos. Isso significa que têm a seguinte propriedade: desde que a(s) premissa(s) seja(m) verdadeira(s), a conclusão será verdadeira. Os argumentos do grupo I têm claramente esta propriedade. Como poderia alguma vez acontecer que o céu fosse azul e a relva verde, sem que o céu fosse azul? Não há maneira nenhuma de Icabod estudar no Balliol College e de todos os estudantes do Balliol College serem inteligentes sem que Icabod seja inteligente. Os argumentos de II carecem da propriedade da validade. As circunstâncias efectivas do mundo fazem com que a premissa do primeiro argumento do grupo II seja verdadeira, mas a conclusão é falsa. E no caso do segundo argumento do grupo II, podemos imaginar circunstâncias nas quais seja verdade que Icabod é inteligente e estuda no Balliol College, mas nas quais (infelizmente) existam outros estudantes não inteligentes cujos espíritos obtusos tornem a conclusão falsa. A lógica é o estudo sistemático dos argumentos válidos. Isto quer dizer que, ao estudar lógica, iremos desenvolver técnicas rigorosas para determinar quais os argumentos que são válidos.
W. H. Newton-Smith
Tradução de Desidério Murcho
Texto retirado de Lógica, de W. H. Newton-Smith (Lisboa: Gradiva, 1998).

Texto copiado daqui.